sábado, 28 de julho de 2012

O que ganha Portugal com o eucalipto?


Texto integral das resposta às questões colocadas pela Jornalista Ana Clara, da revista online Café Portugal, a Paulo Pimenta de Castro, presidente da Direção da Acréscimo, a 16 de julho último.

CAFÉ PORTUGAL – O actual Governo propõe uma discussão pública sobre a proposta de alteração da regulamentação das acções de florestação, onde se considera o eucalipto uma espécie igual à do pinheiro-bravo. Como olha para esta proposta?

PPC – Vemos esta proposta do Ministério, como uma iniciativa avulsa, extemporânea e irresponsável.

Avulsa: A proposta do MAMAOT é uma iniciativa isolada no âmbito do ciclo de produção florestal. O Ministério evidencia grande preocupação na florestação e descora a ligação com a subsequente gestão dessas novas áreas florestadas. Não assegura igualmente o apoio técnico essencial, nem dá garantia de acesso equilibrado aos mercados por parte da produção florestal. Apesar, dos nefastos resultados conhecidos, a Campanha do Trigo, de 1929, pelo menos assegurava estes aspectos.

Extemporânea: Estando em avaliação a Estratégia Nacional para as Florestas (ENF), a actual proposta do MAMAOT aparece descontextualizada, desenquadrada de um todo estratégico. Segundo o anunciado, a discussão pública para a ENF está prevista já para Setembro. Questiona-se a demora deste processo, o qual deveria ter sido prioritário do Ministério. Contudo, mais se questiona sobre a “urgência” da actual proposta quanto à florestação com espécies de rápido crescimento.

Irresponsável: Novas florestações, ou reflorestações, sem garantia de gestão florestal subsequente, podem perpetuar as consequências negativas de que hoje são vítimas as florestas em Portugal: propagação de incêndios e proliferação de pragas e de doenças. Há que cortar este ciclo vicioso. Do nosso ponto de vista, a actual proposta do MAMAOT não aparece no sentido do corte, mas no de perpetuar.

CP – Quais os grandes perigos desta abertura à florestação em matéria do eucalipto?


PPC – Com o objectivo simplista de aumentar o valor bruto das exportações, o Ministério facilita o aumento da área florestada com esta espécie, sem assegurar a subsequente gestão desses novos eucaliptais. Por outro lado, desassocia esta iniciativa da fundamental consultoria técnica aos proprietários florestais (extensão florestal): não basta plantar, é necessário saber fazê-lo e depois gerir de uma forma profissional.

Ora, na actual área de eucalipto em Portugal, a 5.ª a nível mundial, constatam-se já dezenas de milhares de hectares não geridos ou sujeitos a uma gestão deficiente. O eucalipto, a seguir ao pinheiro bravo, é uma árvore com forte risco de incêndio florestal. Ao não garantir a gestão de novos eucaliptais pode-se estar, indirectamente, a promover a “indústria do fogo” nas próximas décadas.

Por outro lado, a posterior reconversão dos eucaliptais, no final do seu ciclo óptimo de exploração, ou seja após o 4.º corte, tem custos elevadíssimos, o que porventura justifica a actual existência de muitos eucaliptais abandonados. No caso, é necessário proceder ao arranque dos cepos, o que pode aportar custos entre os 450 e ou 750 Euros por hectare, envolvendo maquinaria pesada, encargo esse que fica nas mãos do proprietário florestal. Ou seja, acena-se com ganhos de rendas ou de produtividades acima da média e oculta-se o custo final de de reconversão dos eucaliptais.

CP – Quem lucra, na sua opinião, com esta medida? Fala-se sempre na indústria da celulose. É a este sector que esta medida mais interessa?


PPC – Quem lucra claramente é a indústria de pasta celulósica e de papel. Isso não é ilegítimo, discutível é o papel do Ministério.
Se o País lucra? É uma avaliação que importa fazer, ou seja, ao valor bruto das exportações há que deduzir os custos com a depreciação ou destruição dos recursos naturais associados à produção florestal. Ou seja, há que calcular o valor líquido dessas exportações.

Reforçamos. Sem garantir a gestão da floresta, a consultoria técnica aos proprietários (extensão florestal) e um justo funcionamento dos mercados, temos dúvidas que os ganhos dos proprietários florestais estejam assegurados, basta analisar do crescente abandono dos eucaliptais em Portugal, o que parece ser um sinal óbvio da quebra de expectativas neste negócio.

CP – Alguns especialistas consideram que o eucalipto, apesar de não se adaptar a todo o território é economicamente competitivo. Concorda?

PPC – Existindo uma adequada gestão florestal em eucaliptais instalados em regiões propícias à espécie, com solos e pluviosidade adequados, garantindo para isso um serviço de extensão florestal, que assegure, por um lado, a transmissão dos resultados da investigação aplicada e, por outro, a formação profissional dos agentes envolvidos, técnicos, empreiteiros, proprietários e trabalhadores florestais, estarão criadas as condições fundamentais para o aumento da produtividade dos eucaliptais (que não necessariamente da área), e bem assim para o acréscimo do valor líquido das exportações.

Existem hoje, em Portugal, áreas propícias para este fim, como sejam as área de Floresta Certificada, ou as áreas integradas em Zonas de Intervenção Florestal, ambas sujeitas a planos de gestão florestal. Estas áreas podem garantir o retorno económico de iniciativas de arborização e rearborização, com qualquer espécie florestal.

CP – A área de eucalipto tem aumentado e a do pinheiro-bravo tem decrescido. Qual a explicação para este cenário? Vamos assistir à ‘eucaliptalização’ do país?


PPC – As variações de áreas entre espécies são consequência, das estratégias das diferentes indústrias florestais, das expectativas de negócio dos proprietários florestais e dos riscos associados ao investimento nas diferentes espécies (incêndios, pragas e doenças).

Curiosamente, esta variação de área entre estas duas espécies, apesar do esforço dos contribuintes, não parece ter a ver com a existência de apoios financeiros do Estado. Em concreto, o pinheiro bravo recebeu, desde a adesão à UE e só para novas florestações, 700 milhões de Euros de apoios públicos, muito embora, neste mesmo período, a sua área global tenha regredido cerca de 400 mil hectares. Será que os contribuintes ao invés de apoiarem o pinheiro bravo, apoiaram, contra sua vontade, a “indústria do fogo”. Seria bom que o Ministério explicasse esta discrepância.

O eucalipto, após a adesão, não tem sido objecto de apoio financeiro público aos proprietários florestais. Gerou até 1995 grandes expectativas de negócio, mas com o mercado cada vez mais concentrado ao nível da indústria (passámos de 4 para 2 empresas de pasta celulósica), a área de eucaliptal sujeita a abandono tem aumentado. O impacto tem sido evidente (fogos, pragas e doenças).

CP – Qual deve ser o papel do Estado em matéria de política florestal?

PPC – O papel do Estado tem de ser o de definir uma estratégia política para as florestas e o sector florestal, assegurando uma utilização racional dos recursos naturais (o que hoje parece não estar a acontecer), de acordo com os princípios do desenvolvimento sustentável, mas também de responsabilidade social, garantindo os interesses das diversas fileiras silvo-industriais, sejam as tradicionais, sejam as emergentes, como a da biomassa, quer para a produção de energia calorífica, quer para energia eléctrica. Deve ainda acompanhar as relações de mercado nas várias cadeias silvo-industriais, assegurar os meios necessários à realização do cadastro rústico, a uma adequação da fiscalidade à actividade florestal, à redução dos riscos de investimento, à organização da produção florestal (associativismo), a um serviço de extensão florestal (assessoria técnica aos produtores), bem como garantir os meios essenciais à investigação, para, entre outros, promover a quantificação e qualificação de bens e serviços, obtidos nas florestais, ainda hoje sem valor de mercado. Estes últimos serão no futuro fundamentais para a actividade produtiva florestal (p.e: sequestro de carbono, regularização dos regimes hídricos, protecção dos solos, paisagem).

CP – Como se pode explicar que um país como Portugal com potencial de floresta tenha de importar madeira anualmente?


PPC – Esta circunstância é o resultado da incúria dos vários Governos, nas últimas duas décadas. Curiosamente, o Poder Legislativo tem assumido as suas obrigações, mas, a Lei de Bases da Política Florestal (Lei n.º 33/96, de 17 de Agosto), continua ainda longe de atingir as expectativas que criou na altura.

CP – Como podemos exportar a nossa floresta? Quais as grandes urgências que carecemos nesta matéria?


PPC – Garantindo os compromissos assumidos a nível internacional, concretamente no que respeita aos princípios do desenvolvimento sustentável, Portugal dispõe de excelentes condições para a produção de bens e serviços oriundos das florestas, com a subsequente criação de riqueza, aumento do emprego e do bem estar das populações, com destaque para o meio rural, bem como do acréscimo do valor líquido nas exportações. O País regista a este nível, no total dos 27 estados membros da UE, o maior Valor Acrescentado Bruto da fileira florestal por hectare de floresta, 310 Euros por hectare.

Ao nível das exportações, no imediato, o País deverá investir prioritariamente na garantia da gestão activa, profissional e sustentável, dos actuais povoamentos florestais, ou seja, nas áreas florestais instaladas e que, por estarem já em crescimento, podem gerar bens mais rapidamente, como madeira ou cortiça. Deve ainda levar em conta a actual situação económica em Espanha, destino de ¼ das exportações do sector florestal português. Não pode também descorar a aposta na inovação, Portugal ainda exporta muitos produtos de baixo valor acrescentado.


segunda-feira, 23 de julho de 2012

ICNF: Estigmatizado à nascença


Conforme assumido pelo Governo, com a aprovação do Plano de Redução e Melhoria da Administração Central (PREMAC) em setembro de 2011, a fusão da Autoridade Florestal Nacional (AFN) e do Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB), enquadra-se no processo de melhoria organizacional da Administração Central e no ajustamento do peso do Estado aos limites financeiros do País.

Em maio de 2012 é aprovada, em Conselho de Ministros, a criação do Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, I.P. (ICNF). A aprovação da orgânica do ICNF ocorreu passados quase 11 meses da tomada de posse do Governo, 8 meses após a publicação do PREMAC e 5 meses após a aprovação da orgânica do Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAMAOT), que o tutela.

O ICNF herda o estatuto das duas autoridades nacionais com atribuições nos espaços silvestres em Portugal. A AFN assume o património histórico da Administração Florestal das Matas do Reino, criada como organismo autónomo em 1824, e o ICNB descende do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico, criado em 1975, incorporando a Divisão de Parques e Reservas, da então Direção Geral do Fomento Florestal.

No histórico de entidades antecessoras da AFN, com as mais variadíssimas designações nas últimas décadas, assistiu-se a alguns momentos de controvérsia no que respeita á florestação com espécies de rápido crescimento (ERC). Uma delas, que na altura estigmatizou, e talvez ainda estigmatize os Serviços Florestais do Estado, foi a transferência de muitos técnicos superiores destes para as empresas da indústria de celulose, em fase de grande expansão nas décadas de 70 e 80. No final dos anos 80, os serviços conseguiram contribuir para o apaziguamento social dos ânimos face á contestação às florestações com as ERC. A sua imagem ficou contudo beliscada, talvez mais por motivos intrínsecos, do que por fatores externos. Facto é que o seu papel se tem vindo a desvalorizar socialmente ao longo dos anos.

O ICNB e seus antecessores, por seu lado, tiveram uma maior aceitação social, sobretudo em meio urbano, vinculado que está à conservação da Natureza. Foi igualmente contestada a sua atuação, designadamente no que respeita á gestão da Rede Nacional de Áreas Protegidas, embora aqui num contexto de condicionamento da atividade económica.

Concretizada a fusão, não deixa de ser confrangedor assistir à repetição da história, não pelos melhores motivos.

Ao invés de ver valorizados os aspectos socialmente positivos do património histórico dos dois organismos que o antecedem, assiste-se agora à estigmatização da nova entidade, associando-a a uma proposta de alteração legislativa avulsa, extemporânea e mesmo irresponsável, concretamente a que pretende alterar as regras nas ações de florestação com as ERC.


Quer se queira quer não, por profunda inabilidade política, o ICNF está daqui para a frente associado à promoção inconsequente da florestação com eucalipto, promoção essa desprovida de preocupações quanto a uma estratégia nacional, ao ordenamento do território, ao planeamento florestal e, sobretudo, sem exigir garantia de uma gestão sustentável dos espaços agrícolas e silvestres que venham a ser alvo de florestação com estas espécies.

A indústria de celulose e papel é importante para Portugal, compreende-se até o esforço empresarial na defesa do negócio, não se entende é a postura do MAMAOT, quer ao procrastinar a definição de uma Visão para os espaços silvestres em Portugal, quer ao permitir estigmatizar o ICNF logo à nascença, ao fazê-lo debutar perante o País com uma intervenção totalmente desastrosa. 

Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro Florestal
Presidente da Direção da Acréscimo – Associação de Promoção ao Investimento Florestal

(Ver em http://www.vidarural.pt/news.aspx?menuid=8&eid=6584&bl=1 ou em http://diarioagrario.blogspot.pt/2012/07/estigmatizado-nascenca.html)

sábado, 21 de julho de 2012

Considerações sobre a Circular 1/2012, de 21 de maio, da AFN/PSF


Em 15 de julho festejamos o décimo aniversário da criação da nossa Equipa de Sapadores (14-118).


Já fomos tutelados pelos mais diversos organismos desde a inicial DGRF até à recente AFN. Tudo indica que, a partir deste momento, já será o ICFN, I.P que passará a ditar as ordens, face ao recente Decreto-Lei n.º 135/2012, do passado dia 29.


A quem como nós pugna pela defesa de Floresta trabalhando GRATUITAMENTE dia a dia, face às constantes alterações do modus faciendi superiormente difundida, quase lhe dará vontade de rir, ou então, revoltar-se-á. Senão vejamos:


O primitivo Decreto-Lei n.º 179/99 (já abolido) convenceu-nos que viriam aí instrumentos e maneiras fáceis de Apoiar e defender as nossas Florestas. Embarcámos nessa e constituímos a dita equipa. Enganámo-nos, ou melhor: fomos enganados. Rapidamente, por quem de direito (?) começou a solicitar, mais tarde, mas rapidamente, a exigir aquilo a que vulgarmente o mundo administrativo chama de mapas, mapinhas ou mapecos. Viria depois o Decreto-Lei n.º 94/2004 e seus consequentes despachos, circulares ou afins que acabariam com os ditos mapas a passaram a exigir registos informáticos, alguns de suporte digital. Nem queremos falar das determinações entretanto emanadas.


Na vigência da AFN por todos inicialmente conhecida por Autoridade Florestal Nacional e onde também nós inicialmente pensámos ver um Apoio Florestal  Nacional, acabou por efetivamente se revelar de pouco ou nenhum Apoio, alguma Autoridade e, com as recentes determinações, nomeadamente com as constantes da Circular em apreço, conclui-se que, afinal, estamos apenas perante Autoritários Florestais. Facilmente se conclui que, o que se pretende é dificultar, dificultar, dificultar até que as entidades promotoras desistam…, deixem de vencer direito a ajudas… contenção de custos… redução de défice.


Se lermos com atenção a introdução ao recentíssimo Decreto-Lei n.º 135/2012, do dia 29 p.p., concluiremos que, de facto, as determinações constantes da Circular em apreço, defendem precisamente o contrário daquilo que defende o referido Decreto-Lei, se bem que, ambos, visam contenção de custos.


Entendemos bem que haja, Apoio, Autoridade, rigor, contenção de custos, responsabilização daqueles que não cumprem. Não entendemos bem que haja complicação atrás de complicação, exigência atrás de exigência, burocracia em cima de burocracia.


Vem tudo isto a propósito do modus faciendi exigido ao longo de toda aparte A (Procedimentos para a transferência de cada tranche do apoio ao funcionamento) da circular. Será que ninguém consegue avaliar do aumento de custos de contexto que tais determinações originam? Será que é assim tão difícil concluírem que as Organizações como a nossa e similares, são dirigidas por “carolas” voluntários, que não se importam de dedicar grande parte do seu tempo a estas causas, mas que também necessitam de tempo para outras coisas? Aquilo que é exigido (em termos administrativos), ocupa grande parte do tempo de vários técnicos na matéria (engenheiros, contabilistas, informáticos, administrativos, enfim…). Farão ideia o que é chegar a um gabinete de contabilidade, pedir com todo o respeito se se podem retirar faturas
da contabilidade, a fim de serem fotocopiadas sabe-se lá para quê? Obviamente que não fazem ideia, pois, se estivessem ao corrente de tais maneiras nunca determinariam o constante do n.º 3 da parte A da Circular em causa.


Nós temos contabilidade organizada, todos os documentos são e estão devidamente classificados, ordenados e arquivados. Toda a AUTORIDADE (seja ela Tributária, Florestal, de Estatística ou outra qualquer), pode consultar e, por que não, fotocopiar, a cada momento,… agora, duplicar documentação como nos está a ser exigido, não vemos bem. Temos direito a perguntar: AFINAL, PARA QUE SERVEM o RELATÓRIO DE GESTÃO (4 páginas), a ANÁLISE ECONÓMICA E FINANCEIRA (7 páginas) os BALANCETES GERAIS FINANCEIROS (6 páginas), a Demonstração de Resultados por Natureza e os Balanços que também nos pedem pelo Ofício Circular n.º 158, de 18 de junho passado? Bastará analisar superficialmente os nossos agora referidos documentos para rapidamente verem todos os nossos custos com a equipa de sapadores Florestais; discriminadamente, ferramentas (conta 623 - 1.606,36 €) combustíveis (conta 6242 - 5.625,38 €)  vencimentos (conta 632 - 40.982,77) encargos sobre remunerações (conta 635 - 7.650,72 € e fornrcim etc. etc. Ao fim do ano tudo é transparente. Querem também a modelo 22 de IRC? É só pedirem; Querem a IES (Informação Empresarial simplificada?) peçam, nós remetemos…; Pedir, melhor, exigirem coisas sem pés nem cabeça, não achamos bem.


Rapidamente responderemos e remeteremos tudo o constante do referido Ofício Circular n.º 158 DUGEF, de 18 de maio de 2012, cumprindo assim a Portaria n.º 118-A/2009. Não estou a ver maneira de cumprimos o referido ponto 3 A da Circular, uma vez que, como já referido, o Sr. contabilista não autoriza retirada de documentos da contabilidade.


Essa coisa toda de anexos e fotocópias, não será apenas para as organizações sem personalidade jurídica??? Agradecemos comunicação sobre as presentes dúvidas.


Esmeramo-nos em cumprir o que é de cumprir. Aprendemos que são para cumprir as Leis, Decretos-Lei, Acórdãos, Portarias… Não nos parece obrigatório respeitar circulares emanadas por quem não superintende sobre nós e muito menos por entidades que já não existem (veja-se art.º 14 do Decreto-Lei 135 último).



Fortunato Santos Preto
Presidente da Direção, FLOREST’ÁGUA, Associação de Produtores Florestais e Regantes de S. Martinho. 

terça-feira, 17 de julho de 2012

Pode o Eucalipto tornar-se uma espécie invasora? As maiores limitações para o potencial invasor do Eucalipto (E. globulus)


Muitos trabalhos analisam a questão da biodiversidade associada às exóticas (incluindo o Eucalipto) mas isso não tem necessariamente a ver com o carácter invasor (ou não) de uma espécie. A questão base consiste em saber se a boa adaptação da espécie ao novo meio equivale à sua naturalização ou se estamos perante um carácter verdadeiramente invasor. Vários estudos em todo o mundo (Califórnia, Brasil, Chile, África do Sul, etc) têm abordado esta questão e têm conseguido alguns dados importantes acerca da capacidade de regeneração natural do Eucalipto e da sua capacidade de ocupar outros habitats naturais ou semi-naturais (Ashton 2000 - Ecology of eucalypts regeneration; Florence 2004 - Ecology and silviculture of Eucalypts Forest).
Em Ritter and Yost (2009) está que o E. globulus e outras espécies de eucalipto estudadas não se reproduzem espontaneamente nem têm potencial para o fazer (in Diversity, reproduction and potential for invasiveness of eucalyptus in Califórnia).
No estudo de Quiroz et al.(2009) em que a questão central era se poderiam ou não considerar o eucalipto como uma espécies invasora no Chile a conclusão foi que não existiam evidencias para considerar o eucalipto como espécie invasora ou com potencial para o ser. Muitas vezes o estabelecimento das plântulas de eucalipto era ultrapassado em competição com outras espécies e a sua propagação era limitada (muito baixa sobrevivências das plântulas de eucalipto).
No Brasil (Muller da Silva et al. 2011), onde também esta questão quanto ao poder invasor do eucalipto está a ficar mais comum, referem que:
  • As plântulas de eucalipto raramente são encontradas além dos limites das áreas de plantação;
  • Dentro das áreas de plantação o eucalipto pode germinar mas as suas plântulas aparentemente não se estabelecem (não sobrevivem);
  • Assim o potencial de invasão por sementes produzidas nas plantações de eucalipto é muito baixo. 

A distância que as sementes conseguem atingir a partir da origem de produção está muito ligada ao risco de invasão (Wallace et al., 2008). Richardson et al. (2000) definiu que uma espécie com potencial invasor é aquela que se propaga mais de 100m em 50 anos ou menos. Seguindo esta definição, Ruthrof et al (2003) defende que o eucalipto tem sofrido um processo de naturalização mais do que de invasão. Porque segundo o seu estudo tem existido um estabelecimento de plântulas apenas a 60 metros ao longo de 66 anos, e não de 100m em menos de 50 anos.
Em Richardson and Rejmanék (2011) está referido que cerca de uma centena de espécies de eucalipto foram introduzidas na África do sul, onde foram cultivadas em diferentes níveis de intensidade em plantações comerciais. Surpreendentemente, tendo em conta o tempo de longa residência no país, o eucalipto está longe se ter um comportamento invasor em comparação, por exemplo, com o Pinus (com oportunidades semelhantes para invadir).
Muito trabalho ainda é preciso fazer para explicar o porquê de o eucalipto, tão bem sucedido numa variedade de habitats fora do seu habitat nativo na Austrália e altamente transportado por todo o mundo, tem uma performance relativamente pobre como invasora. Muitas vezes previu-se o eucalipto como sendo uma espécie muito invasora, mas depois concluiu-se que não o é.

A pressão de propágulos é claramente um condutor importante de invasão o que sugere que a resposta poderá estar nos requerimentos específicos para a germinação e sobrevivência das plântulas de eucalipto. Neste sentido todos estes estudos têm referido várias características do eucalipto que pode limitar a sua regeneração natural, como por exemplo:
  • Produção de sementes muito pequenas com poucas reservas energéticas para a germinação e desenvolvimento das plântulas;
  • As sementes necessitam de estratificação;
  • A germinação depende de condições internas e externas específicas (temperatura, disponibilidade hídrica, luz, etc.).
  • A dispersão das sementes é muito curta – as sementes são dispersas pela gravidade e geralmente muito perto da “planta-mãe”;
  • As sementes não permanecem viáveis no solo por muito tempo e muitas vezes não conseguem penetrar a folhada que está sobre o solo;
  • Na fase de germinação e estabelecimento das plântulas é facilmente ultrapassado por competição com outras espécies nativas ou exóticas e por espécies invasoras agressivas, como a Acácia spp., que competem por luz, água e nutrientes.
  • A folhada e a presença de outras espécies arbustivas ou herbáceas nas florestas nativas limitam bastante o estabelecimento das plântulas de eucalipto. 

Em Portugal, também esta questão quanto ao comportamento invasor ou não do eucalipto tem estado cada vez mais presente junto das ONGs, Comunidade Cientifica e mesmo da Administração Pública. Este assunto tem originado alguma especulação e até acusação pública, sem qualquer documentação de suporte do potencial invasor do eucalipto em Portugal. Existe no nosso País um vazio de informação de apoio às autoridades ambientais e florestais (ICNF) sobre este tema. 

É com esta problemática que nasce o projecto “Estudo comparativo das principais florestas cultivadas em Portugal: Eucalyptus globulus e Pinus pinaster – expansão natural num ambiente em mudança” em parceria com a FCT e com a Portucel – empresa produtora de pasta e papel, S.A.. O objectivo geral deste estudo é avaliar a capacidade de regeneração natural de Eucalyptus globulus e de Pinus pinaster em diferentes situações ambientais e determinar qual a sua taxa de sucesso na ocupação de áreas extensas em habitats naturais ou semi-naturais, sem intervenção directa do homem. Tanto quanto sabemos, em relação ao eucalipto e ao pinheiro-bravo, não existem ainda estudos em Portugal publicados que verifiquem estes aspectos. A urgência de um estudo destes em Portugal, o valor cientifico do mesmo, o seu acompanhamento pelas Doutoras Professoras Otília Correia e Cristina Máguas (da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) de elevada credibilidade cientifica e conhecimentos na área e ainda o apoio logístico e financeiro por parte da Portucel, contribuíram para a avaliação positiva e eleição deste projecto por parte da FCT (Fundação para a Ciência e Tecnologia).
Este estudo vem pois preencher uma lacuna de conhecimento e de trabalhos concretos e específicos sobre a expansão natural das principais espécies florestais cultivadas em Portugal (Eucalyptus globulus e Pinus pinaster). Está igualmente garantida a publicação/divulgação dos resultados no sentido de ver esclarecido o eventual risco de invasão pelo eucalipto,  diminuindo significativamente a margem para a especulação pseudo-científica a que temos assistido à volta desta espécie em Portugal.

Patrícia Fernandes
Bióloga, bolseira da FCT

Referências:
Muller da Silva, P. H., Poggianib, F., Sebbenn, A. M., Mori, E. S., 2011. Can Eucalyptus invade native forest fragments close to commercial stands?Forest Ecology and Management 261: 2075–2080
Richardson, D. M., Pysek, P., Rejmánek, M., Barbour, M. G., Panetta, F. D., and West, C. J., 2000. Naturalization and invasion of alien plants: concepts and definitions. Diversity and Distributions, 6:93–107
Richardson, D. M.and Rejmánek, M., 2011. Trees and shrubs as invasive alien species – a global review. Diversity and Distributions, 17:788–809
Ritter, M. and Yost, J., 2009. Diversity, Reprodutction, and potential for invasiveness of Eucalyptus in California. MADRONO (56), 3:155–167.
Ruthrof, K.X., 2004. Invasion by Eucalyptus megacornuta of an urban bushland in Southwestern Australia. Weed Technol. 18, 1376–1380.
Wallace, H.M., Howell, M.G., Lee, D.J., 2008. Standard yet unusual mechanisms of long-distance dispersal: seed dispersal of Corymbia torelliana by bees. Divers. Distrib. 14, 87–94.



quinta-feira, 12 de julho de 2012

REFLEXÕES A PROPÓSITO DA DISCUSSÃO PÚBLICA DA NOVA PROPOSTA DE DIPLOMA SOBRE ARBORIZAÇÕES




  • Depois do notabilíssimo trabalho dos Serviços Florestais de fixação das dunas e da correcção torrencial (efectuado no início do séc. XX) o Estado Novo decidiu nos seus Planos de Fomento, fazer de Portugal um “país florestal”.
  • Em solos paupérrimos e esqueléticos apostou-se em força no Pinheiro Bravo, como espécie rústica e “pioneira”, capaz de proporcionar a recuperação das séries florísticas e dos solos e de produzir matéria prima lenhosa para a indústria de serração e… para a indústria de pasta celulósica.
  • A “descoberta” portuguesa (posterior) do eucalipto globulus para fazer, pela primeira vez no Mundo (!), pasta Kraft branqueada e, depois, papel de altíssima qualidade, “empurrou” a indústria nacional de pasta celulósica para o eucalipto em detrimento do pinheiro, com vista a tirar partido das vantagens competitivas que o eucalipto globulus proporcionava.
  • A decisão política de instalar a Celangol em Portugal, após a Revolução de 1974, com o nome de Soporcel, desencadeou uma corrida “natural” às terras para plantar eucalipto, com o objectivo de satisfazer as necessidades da indústria nacional.
  • Vivia-se, à época, num quadro de total “desregulação” em matéria de florestações e de erros técnicos e de sobressaltos sociais que ocorreram nesse período de “eucaliptização” – alimentada por uma política de fomento da espécie alicerçado no preço – nasceu a legislação de 1988 (DL 175/88) baseada no “princípio da precaução” e com medidas técnica e socialmente pioneiras (obrigatoriedade de projecto silvícola prévio, envolvimento social das CM’s, introdução de AIA e EIA, etc.).
  • A luta de competências no interior da Administração Pública e a ignorância da realidade florestal geraram porém (em anos sucessivos e sem cessar) uma “montanha” de peças legislativas descoordenadas, caóticas e técnica (e ambientalmente) inúteis, torcendo a legislação de 1988 (que agora se viu elogiada pela Quercus e pela LPN…).
  • Recorde-se aqui que a cultura do eucalipto nunca esteve interdita (ou sequer condicionada), de per si, antes se destinando todo o processo de licenciamento à prestação da garantia do uso das melhores práticas silvícolas, da salvaguarda de recursos naturais importantes e do cumprimento de legislação anexa mas autónoma.
  • A partir dos ditos anos de 80 a indústria passou, por razões óbvias, a prestar especial atenção (e apoio técnico e financeiro) aos IFN, de forma a planear o seu futuro.
  • Neste ambiente disfuncional, o Estado nunca se absteve – antes pelo contrário – de estimular a indústria (não a floresta) para crescer e exportar.
  • O último exemplo foi o aumento de capacidade da CELBI (mais 300 mil ton. de pasta correspondentes a mais 1 milhão de metros cúbicos de eucalipto) em 2004/2005, quando após os fogos de 2003 e 2005, já todos sabiam que o eucaliptal português não seria capaz de alimentar a capacidade industrial já antes instalada em Portugal.
  • O sector em geral e a Portucel em particular, em Dezembro de 2005 (aquando do grande investimento industrial que protagonizou) apresentou ao Governo dossiers documentados que provavam a necessidade (e compatibilidade ambiental) de florestar (e reflorestar) com urgência mais e melhores eucaliptais.
  • O Código Florestal (aprovado no final do primeiro governo do Eng. Sócrates, sendo Secretário de Estado o Dr. Ascenço Simões) já incluía nas suas medidas, a solução de parte dos problemas burocráticos associados ao licenciamento de florestações e reflorestações (com eucalipto e não só): Revogação de “ganga” legislativa, prazos rígidos para aprovação de projectos (excepto para o abate de sobreiros), limitação do valor das taxas, diminuição drástica da intervenção das Autarquias, etc. já aí constavam, sem que se tenha registado contestação pública ou política...!
  • Em 2007 o ISA publicou (ISA Press) o “estado da arte” da investigação sobre os impactes ambientais do eucalipto – com um notável Prólogo do Prof. Oliveira Baptista - e os Serviços Florestais foram entretanto acumulando saber e conhecimento dos impactes associados ao acto de florestar e reflorestar.
  • Foi ficando óbvio para todos que o que importava/importa acautelar era/é a preservação do solo, da água e da biodiversidade e isso não é específico do eucalipto nem pesa da mesma maneira nas florestações e nas reflorestações.
  • O actual projecto de diploma – pesem embora as suas limitações – é um passo positivo na resolução do problema burocrático e na adopção / incorporação do conhecimento científico relativo às arborizações e rearborizações (dispensando estas últimas de uma série de procedimentos tecnicamente inúteis).
  • A proposta legislativa em causa não resolve – nem é a peça legislativa para o fazer - a questão da (necessária) diminuição do risco associado à implantação de novos espaços florestais, não acautela os problemas eventualmente associados à excessiva extensão de massas florestais excessivamente contínuas mal geridas e não melhora, por si só, a sustentabilidade da floresta portuguesa.
  • O documento – que não deixa por isso de ser positivo - não dispensa a tomada de medidas urgentes para uma gestão profissional e activa dos espaços florestais, com vista ao fomento da diversidade necessária das espécies em presença e da diminuição do risco associado ao investimento florestal em Portugal (só possível com escala adequada das unidades de gestão florestal).
  • Sabendo-se hoje que o eucalipto é a única espécie que paga as operações culturais e as medidas ambientais indispensáveis numa silvicultura moderna, sã e de baixo risco, importa que o Governo (ou Governos) adoptem medidas que estimulem e viabilizem economicamente alternativas (complementares) de espécies ambientalmente (e industrialmente) interessantes que hoje não são economicamente viáveis.
  • Ora se isso hoje não está a ser conseguido tal não se fica, obviamente, a dever aos proprietários florestais privados nem, muito menos, ao eucalipto enquanto espécie florestal.
  • A prova do que fica dito é que o acréscimo (sensível) de área de eucalipto nos últimos 30 anos, quase integralmente conseguido com investimentos privados (com a excepção pontual do Projecto do Banco Mundial, antes da adesão à CEE) ao passo que o pinho, inequivoca e deliberadamente apoiado pelos dinheiros ditos “públicos” (700 milhões de euros após a adesão, só para áreas novas) não só não gerou um acréscimos da área (generosamente) subsidiada pelos dinheiros disponibilizados a fundo perdido (350 mil hectares) como ainda recuou 400 mil hectares no mesmo período. Ou seja, uma espécie cresceu com o investimento privado e gerou riqueza para o país e a outra recuou e delapidou, sem glória nem proveito para o país, o dinheiro dos contribuintes nacionais e comunitários.
  • Obviamente que tal não se fica a dever à espécie em si mas ao facto de a primeira gerar meios financeiros para ser bem (ou medianamente) gerida e protegida, enquanto a outra continua economica e estruturalmente inviável.
  • É pois claro o papel do Estado e da Sociedade: Criar condições para que o dinheiro público investido – e bem – nas espécies economicamente menos rendáveis seja aplicado em condições de risco e sucesso aceitáveis.
  • (Tal não quer dizer que não se deva ajudar igualmente a melhoria da gestão dos pequenos povoamentos de eucalipto que, ainda hoje, constituem uma parte significativa da “floresta social” que predomina em Portugal...).
  • E todos sabemos donde vem o risco e o inerente insucesso... não é, seguramente, do sucesso do eucalipto!


João M. A. Soares
Engenheiro Agrónomo

terça-feira, 10 de julho de 2012

A importância de uma PARCSI


Face à concentração empresarial existente nas três principais fileiras silvo-industriais, onde assumem especial destaque:

  • O Grupo Sonae, no pinheiro bravo;
  • O Grupo Portucel Soporcel, no eucalipto; e,
  • O Grupo Amorim, no sobreiro.

Importa garantir a transparência dos mercados dos produtos florestais, a par do que já acontece no setor agroalimentar, tendo em vista uma adequada e justa formação dos preços, evitando potenciais fenómenos de cartelização ou uma desajustada supremacia da indústria face à produção florestal. Este é um fator determinante para criar e assegurar expectativas de renda aos proprietários florestais e assim contribuir para o fomento da gestão ativa nas suas explorações.

O absentismo existente na gestão das florestas em Portugal tem de ser estudado em detalhe. Contudo, é possível afirmar que, em grande parte, o mesmo advém das fracas expectativas dos proprietários na capitalização das suas propriedades, em geral de minifúndio e de solos mais pobres, e à fraca ou nula rentabilidade que podem auferir das produções que nelas podem obter, tendo em conta que os preços de venda são determinados por terceiros, pela indústria ou por intermediários.

Importa ainda salientar o elevado risco do investimento florestal, face aos incêndios, às pragas e às doenças, bem como o desajuste do fisco face às características da produção florestal.

Uma política de preços equilibrada, associada a programas de investigação e de extensão florestal, integrados em lógicas de fileira, assegurarão o crescimento do investimento florestal em Portugal, seja em novas arborizações, mas sobretudo na consolidação das atuais florestas, concretamente através da sua gestão, que se quer profissional e sustentável, minimizando os impactos catastróficos dos incêndios florestais e das pragas e doenças.

Se forem criadas expectativas de segurança e de rentabilidade fiável, quer na produção de bens, mas também na prestação de serviços ambientais em áreas florestais, seguramente os proprietários florestais serão os primeiros a adotar uma gestão sustentável nas suas explorações.

Desta forma, deverá o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (MAMAOT), considerar a criação de uma plataforma de acompanhamento das relações da cadeia silvo-industrial.


Paulo Pimenta de Castro
Eng. Florestal / Presidente da Direção da Acréscimo
(publicado no Agroportal: http://www.agroportal.pt/a/2012/pcastro3.htm)

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Carta do “Príncipe da Tasmânia” ao “Rei de Portugal”

Caro Sobreiro, Senhor meu primo
Trata-o por primo porque, como sabe, a minha família das Mirtáceas, em tempos bem distantes, viveu na “sua” Península Ibérica e isto de parentescos é sempre possível entre gente de linhagem …
Escrevo-lhe para o saudar e para lhe prestar homenagem pela sua elevação oficial a Símbolo Nacional, no passado dia 22 de Dezembro, na Assembleia da República deste país em que ambos vivemos.
É pois legítimo que neste reino vegetal que nos une, lhe chame, com toda a propriedade, “Rei de Portugal”.
Eu, jovem, esguio, alto e vaidoso (em contraste com o seu porte largo, arredondado e da sua vetusta idade secular, bem como das suas bem mais conservadoras regras de vida) uso e assino, com orgulho, o epíteto que um Autor português me deu, nos idos anos 80, do século XX, relembrando a minha origem: “O Príncipe da Tasmânia”.
É que temos ambos “nobres” e notáveis pergaminhos:

  • O meu primo Sobreiro ocupa 716 mil hectares e eu, Eucalipto, 740 mil hectares[1], ou seja, 21% da floresta portuguesa em terrenos geograficamente complementares;
  • A sua produção de cortiça (na árvore) gera cerca de 110[2] milhões de euros pagos à Lavoura anualmente e eu, do meu lado, contribuo com um valor anual de produção (de madeira em pé) de 200[3] milhões de euros;
  • O valor dos bens manufacturados a partir da cortiça que produz ronda anualmente os 1110[4] milhões de euros enquanto os valores da pasta celulósica e do papel produzidos a partir da minha fibra atingem os 1891[5] milhões de euros;
  • As nossas exportações, para os cinco Continentes, estão entre as primeiras do País:
  • O primo Sobreiro exporta 754[6] milhões de euros de produtos de cortiça e eu, Eucalipto chegado da Austrália há mais de 150 anos, exporto 1340[7] milhões de euros de pasta celulósica e de papel.
  • A “jóia da coroa” da sua produção – a rolha – representa 529[8] milhões de euros exportados, enquanto a minha – o papel gráfico – vale, por ano, 1092[9] milhões de euros de exportação.
  • O carbono armazenado por si, primo Sobreiro, é de 64 Mton CO2 enquanto eu, seu primo Eucalipto, armazeno 66 Mton CO2[10]. Ou seja, somos dos maiores contribuintes líquidos para o sequestro do carbono e para o combate ao efeito de estufa e capturamos anualmente muito mais CO2 que o que as nossas fábricas emitem.
  • Ambos incorporamos uma taxa elevadíssima de Valor Acrescentado Nacional (seguramente superior a 80%) ao invés das grandes exportações portuguesas de produtos não florestais.
  • Ambos suportamos fileiras silvo-industriais poderosas em Portugal e no estrangeiro e somos praticamente o que resta da indústria de capitais verdadeiramente nacionais.
Enfim, meu caro primo Sobreiro, serve esta saudação genuína e sincera para dizer aos portugueses que juntos constituímos uma aliança económica, ambiental e social com que o país pode contar neste momento de emergência económica.
Nós e o nosso primo Pinheiro Bravo, Duque de Leiria e das Landes (que me dizem adoentado), que também merece ser lembrado aqui, constituímos uma boa razão de esperança para Portugal e para os portugueses.
Como imigrante, tenho sido, por vezes, vítima de racismo (fitorracismo) estúpido e irracional, como o são todos os racismos. Mas acredito, caro primo, que tal como a batata, o milho, a laranja e tantos outros imigrantes (vegetais ou não), acabaremos por ser aceites com a naturalidade e a hospitalidade que a razão impõe.
Caro primo, julgo que a complementaridade das nossas pessoas – o Sobreiro, “Rei de Portugal” e o Eucalipto, “Príncipe da Tasmânia” – e a importância do nosso contributo para o Desenvolvimento Sustentável de Portugal, merecem e justificam que eu lhe envie esta homenagem por este meio tão público.
Com o desejo de que o nosso comum amigo Pinheiro Bravo possa regressar - forte, poderoso e saudável – a este clube gerador de bem-estar e riqueza que, com todos os outros preciosos e diversos parentes florestais, constituem a Floresta Portuguesa, apresento-lhe, mais uma vez, primo Sobreiro, os meus mais sinceros parabéns por ser hoje, merecidamente, um Símbolo Nacional.

João M. A. Soares
Engenheiro Agrónomo


[1] Fonte: IFN5 (2005/06)
[2] 716 mil ha x 9 @/ha/ano x 17 euros
[3] 6.4 milhões de m3 sc x 1.2 (20% para a casca) x 25 €
[4] Valor referente a 2010. Fonte: Estudo de caracterização sectorial (APCOR, 2011)
[5] Valor referente a 2010. Fonte: CELPA
[6] Valor referente a 2010. Fonte: Estudo de caracterização sectorial (APCOR, 2011)
[7] Valor referente a 2010. Fonte: Eurostat
[8] Valor referente a 2010. Fonte: Estudo de caracterização sectorial (APCOR, 2011)
[9] Exportação de papel gráfico em 2010 = 1337 ton x 817 €/tonelada.
[10] Os dados de armazenamento de carbono são do IFN5 porque desconhecemos dados oficiais de sequestro anual de carbono destas duas espécies.