A propósito do artigo do
Sr. Eng. João Soares, intitulado “Os prejuízos do eucalipto”, publicado no Jornal "Público" de 14 de Agosto, venho
aproveitar a oportunidade para expressar a minha surpresa e desacordo pela
polémica que mais uma vez se instalou sobre uma espécie vegetal que é o
Eucalipto, que considero um total non
sense e uma perda de tempo e de energia.
Por formação e por
experiência profissional, sempre me fez confusão porque é que a partir dos anos
80 do seculo passado a cultura do eucalipto e a indústria da celulose começaram
a ser alvo de “contestação” por parte de profissionais ligados ao “Ambiente”
(na sua maioria funcionários públicos). Provavelmente esta contestação tenha como finalidade obterem
protagonismo político, depois de criada a Secretaria de Estado, que mais tarde
passou a ser o Ministério do Ambiente. Há que considerar igualmente as
manifestações algo primárias a que assistimos (por exemplo pessoas amarradas com correntes às
máquinas para impedir as florestações), protagonizadas pelos
“grupos ambientalistas” que entretanto começaram a surgir.
A cultura intensiva do
eucalipto e o seu aproveitamento pela indústria para o fabrico de pasta de
papel vem muito detrás. Basta recordar que muitos dos ensaios de plantações com
eucaliptos foram iniciados, nos anos 50 em Moçambique, pela então Junta do
Ultramar, e foram posteriormente continuados em Portugal continental pela
empresa CUF-Companhia União Fabril, que recrutou para os seus quadros alguns
dos técnicos vindos de Moçambique. Foi no Centro de Estudos Agronómicos da CUF
em Sacavém que se iniciaram e desenvolveram os primeiros ensaios em vasos com o
Eucalipto, visando a determinação da sua adaptação a diversos tipos de solos e
foram também levado a cabo ensaios de fertilização que determinaram o
aparecimento das normas de adubação da cultura. De tal modo os resultados foram
interessantes que a CUF estabeleceu uma sociedade com a empresa sueca Billerud
AB, tendo surgido em 1965 a Celulose Billerud, SARL (mais tarde a CELBI –
Celulose Beira Industrial, SA), onde a CUF detinha 23 % do Capital, a Billerud
AB 71 % e um grupo de produtores florestais 6%. Esta unidade industrial foi
construída junto à cidade da Figueira da Foz porque apresentava as seguintes
vantagens: proximidade de área florestais, abundância de água, indispensável ao
processo produtivo, proximidade do Oceano Atlântico e de um Porto Comercial e
disponibilidade de mão-de-obra qualificada. E assim se deu início à
transformação da madeira de eucalipto que começou a ser plantado, inicialmente
nos terrenos junto à fábrica, como uma cultura agrícola intensiva, considerando
o número de plantas por hectare (entre 1.200 e 1.400), com a tecnologia
utilizada na agricultura – escolha de solos, análise de terra, preparação do
terreno, normas de adubação, etc.
Durante quase 20 anos que
não se ouviu qualquer tipo de contestação à cultura do Eucalipto propriamente
dita, verificando-se sim alguma resistência e protesto contra o mau cheiro que
era típico de todas as unidades de celulose do país. Os eucaliptos sempre foram
vistos como árvores decorativas magníficas pelo seu rápido crescimento e porte,
existindo vários exemplares em quase todos os montes alentejanos. Apareciam
também em jardins, nas bermas das estradas (com a sua lista branca), como
cortinas de protecção contra ventos, protecção de taludes, etc.
Não é pois uma árvore
desconhecida da população portuguesa e quando nos anos 60 começou a ser
plantada como uma cultura agrícola para a produção de madeira, que era
utilizada por uma indústria de sucesso (já nessa altura), e que dava trabalho a
muitos milhares de portugueses, não se registavam contestações ao nível das que
começamos a assistir nos finais dos anos 80.
Por vezes as empresas
como os homens são vítimas do seu próprio sucesso e neste caso a indústria da
pasta de papel, que sempre apresentou resultados positivos apesar das
convulsões políticas e socioecónomicas que se seguiram ao 25 de Abril, começou
então a ser “contestada” por grupos de cidadãos associados em organizações
ditas “ambientalistas” e também pelas recém formadas instituições públicas
ligadas ao “Ambiente”. Procuravam protagonismo ou se possível cortar alguma
fatia do bolo em troca de moderar posições? Nunca o saberemos.
Na verdade nos anos em
que trabalhei no terreno, junto dos proprietários agro-florestais, nunca estes
se queixaram dos “malefícios” da cultura do eucalipto, a não ser em situações
de extremas de propriedades ou de vizinhança.
A verdadeira mudança
verificou-se quando foi atribuida uma cobertura exagerada e desproporcionada
aos protestos dos “ambientalistas urbanos”, que animados dum espirito algo
mesquinho e de inveja pelo sucesso, transmitiram ao “público” urbano uma ideia
errada do que na verdade é e representava a cultura do eucalipto para a
produção de pasta de papel. Ideias que infelizmente ainda perduram, apesar dos
resultados da investigação científica e que, em meu entender, deveriam ser
correctamente desmistificadas.
A cereja em cima do bolo
da querela apareceu quando alguns governantes dos sucessivos governos e também
alguns autarcas, viram uma janela de oportunidade se aderissem de forma directa
aos protestos anteriormente referidos, que lhe poderiam angariar votos. Assim
foram criando leis atrás de leis, que não proibindo a cultura do eucalipto, a
dificultava burocraticamente, principalmente para os pequenos proprietários,
impedindo-os de rentabilizar os seus terrenos, à falta de melhores
alternativas. Neste cenário, paulatinamente, foram sendo criados inicialmente os chamados “estudos de impacte ambiental”,
depois as RAN, REN, Natura 2000, os Parques Naturais, etc. Enquanto este
verdadeiro impedimento de rentabilizar a propriedade privada ocorria ninguém
reclamou… Pelo menos não recordamos quaisquer reportagens de rádios, jornais ou
televisões e muito menos de grupos de cidadãos ligados ao ambiente
insurgirem-se contra a apropriação de um direito fundamental da democracia que
é a existência da propriedade privada, nem contra o crescente despovoamento do
território, associado à quebra de rendimento da actividade agroflorestal. Ao
mesmo tempo utilizavam-se por exemplo os regadios do Ribatejo ou da Beira
Interior para produzir tabaco (porventura subsidiado) e nunca se ouviu nenhum
protesto sobre esta questão. Julgamos ser muito mais pernicioso para a saúde
pública o tabaco do que as plantações de eucalipto. Passeando pelo zonas rurais
não é invulgar encontrar plantações de vinhas e pomares em zonas de encostas
sem qualquer protecção contra a erosão (as linhas das culturas são
perpendiculares às curvas de nível). Não conheço protestos ambientalistas nesta
área. As descargas dos efluentes das unidades pecuárias e dos próprios
municípios para as linhas de água, devido à inexistência, degradação ou mal
funcionamento das ETARs, constituem um verdadeiro atentado à saúde pública e ao
ambiente. Nunca assistimos a protesto de ambientalistas junto dessas unidades
ou os poderes públicos, centrais e locais, exercerem as suas competências
punitivas e restritivas nesta matéria.
Pelo exposto e tendo em
conta as poucas alternativas que restam aos proprietários agro-florestais, em
especial do minifúndio do litoral português, a actual proposta de alteração da
legislação, apesar de não ser perfeita, é mais do que justa e necessária.
Contudo existe, em meu entender, um factor que é determinante para o êxito
deste grande progresso legislativo e que passa pela extensão, de modo a
“ensinar” como produzir mais quantidade, melhor produto final e a melhor preço.
A este propósito é
paradigmático e mesmo surpreendente o que se passa com a fileira do pinho, em
especial com a sua industria tradicional – a serração. Verifica-se que em
certas zonas do país estas indústrias basicamente desapareceram (basta analisar
o numero de unidade que fechou nos últimos 5 anos), verificando-se um vazio de
aproveitamento da madeira de pinho que valorize os investimentos realizados pelos
proprietários. A madeira para serração sempre foi valorizada, uma vez que a sua
utilização estava ligada principalmente à industria do mobiliário,
sequencialmente para o fabrico de paletes e finalmente para a industria dos
aglomerados. O interessante é que os grupos ambientalistas, que deveriam estar
preocupados com o desaparecimento de indústrias a jusante, que realizassem o
aproveitamento do material lenhoso de uma fileira com impacto directo no meio
rural, nada dizem e não apresentam nem soluções nem alternativas para as
populações.
Mas o mais surpreendente
é que se verifica a utilização de madeira de pinho para serração, com mais de
40 cm de diâmetro, da maneira mais primária possível (ao nível da serradura)
para a produção de peletes energéticas e nem os grupos ambientalistas, nem os
meios de comunicação social, nem os próprios serviços públicos, que autorizam
estes investimentos (centrais e autárquicos) e que devem supervisionar estas
actividades, nada dizem… Porque será?
A verdade é que em diversas
regiões do país já estão instaladas unidades produtoras de peletes com
capacidades próximas das 100.000 t / ano, comportando-se como verdadeiros
predadores da floresta local, uma vez que não possuem 1 ha de terreno e não
fomentam a reflorestação, deixando o país bem mais pobre do que as plantações
de eucalipto.
João Paulo Mourato
Engenheiro Agrónomo - Consultor
Membro Sénior da Ordem dos Engenheiros
(Artigo também publicado no Agroportal, em http://www.agroportal.pt/a/2012/jpmourato.htm#.UDogXdaPWrg)
Membro Sénior da Ordem dos Engenheiros
(Artigo também publicado no Agroportal, em http://www.agroportal.pt/a/2012/jpmourato.htm#.UDogXdaPWrg)
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