A ministra Assunção Cristas estabeleceu recentemente, aquando do
lançamento da campanha “Portugal pela Floresta”, uma abordagem comparativa da
floresta a um tesouro, um “tesouro verde”.
Não pretendo aqui fazer uma análise à campanha “Portugal pela
Floresta”, iniciativa que surge após a concretização de uma ação fraturante,
como não se via desde os finais dos anos 80. Não que esta ação deva ser
abordada apenas na ótica das espécies florestais, já que uma aposta avulsa no
fomento florestal sem garantias de uma adequada gestão subsequente, do ponto de
vista técnico e também comercial, é um erro político que o País tem assumido
desde o início dos apoios da PAC às florestas. No caso em concreto, o
Decreto-Lei n.º 96/2013, a ação fraturante, não é mais do que uma garantia governamental
ao reforço da oferta (em área), tendo em vista a manutenção de uma estratégia
de preços baixos à produção por parte da indústria de trituração.
Regressemos pois ao “tesouro”, depreendendo-se que o mesmo se deva
considerar pleno de “preciosidades”.
A comparação da floresta a um “tesouro verde” não é aliás uma
ideia nova. No mesmo quadrante, já em tempos o ex-ministro Mira Amaral
estabeleceu uma comparação da floresta a “petróleo verde”.
Em comum, as duas comparações associam-se a uma lógica de extração
de recursos naturais, as “preciosidades”. Num âmbito mais vasto, ocorrendo esta
extração fundamentalmente em meios rurais, ela tem estado associada à
incapacidade política em conter o êxodo rural, o persistente despovoamento do
interior, acompanhado nalgumas regiões do país pela desertificação (perda de
capacidade produtiva dos ecossistemas).
Mas, será esta visão extrativista, de “tesouro verde” ou “petróleo
verde”, passível de associação com os objetivos da política florestal nacional,
como definida na Lei de Bases da Política Florestal (Lei n.º 33/96, de 17 de
agosto)?
Ao contrário das expressões ministeriais, de “tesouro verde” ou
“petróleo verde”, o espírito da Lei, aprovada por unanimidade pelo Parlamento,
parece estar mais associada à imagem de um mealheiro, já agora um “mealheiro
verde”.
Com efeito, o usufruto das oportunidades que um mealheiro nos pode
proporcionar está necessariamente dependente de uma prévia acumulação de fatores
indutores.
Logo de início, um desses indutores, o principal num País onde
mais de 90% das superfícies florestais se encontram no regime privado, são as
pessoas, as famílias e as comunidades rurais que possuem tais espaços. A este nível,
a estratégia extrativista de “tesouro” ou “petróleo” apenas tem empobrecido os
meios rurais nas últimas décadas. Curiosamente, esta situação ocorre apesar de
coincidir com avultado financiamento pela Sociedade às florestas portuguesas.
Num outro plano, outro indutor essencial consiste na
disponibilização de capacidade técnica e comercial a quem possui ou gere as
superfícies florestais portuguesas. Uma disponibilização de capacidade técnica,
assente em processos contínuos de produção de conhecimento, com os resultados
adequadamente transmitidos a quem deles necessita, por forma a produzir bens e
serviços a partir das florestas, de uma forma sustentada, sustentável e
responsável. No plano comercial, importa garantir que as lógicas de fileira,
constituídas para o usufruto dos bens e serviços de base florestal, assentam em
negócios que não comprometam desfavoravelmente nenhuma das partes,
principalmente aquela cuja atividade ocorre nos espaços florestais. Uma lógica
de “tesouro verde” ou “petróleo verde” não se enquadra neste espírito, não
salvaguarda um usufruto sustentado, sustentável e responsável das superfícies
florestais e subjuga as famílias e comunidades rurais a interesses externos às
florestas.
Importa assim analisar urgentemente se o País, em matéria de
política florestal, deve persistir num rumo de “tesouro verde” ou “petróleo
verde”, ou se pelo contrário, está na hora de mudar para um novo rumo, um novo
paradigma de “mealheiro verde”.
Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro
Florestal
Presidente
da Direção da Acréscimo – Associação de Promoção ao Investimento Florestal
(Publicado no Agroportal, em http://www.agroportal.pt/a/2014/pcastro2.htm)
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