David
Attenborough, naturalista britânico, há décadas vem habituando
gerações a assistir no sofá às maravilhas e agruras da vida
selvagem. Relatos apaixonantes, acompanhados de imagens
deslumbrantes, pontuaram em várias séries emocionantes. Produzidas
pela BBC, estas séries chegavam regularmente às nossas salas
através da televisão.
Numa
recente aparição,
Attenborough deu a sua voz à defesa das plantações lenhosas.
Defendeu-as como instrumento para preservar as florestais naturais.
Segundo nos diz, as plantações são essenciais para diminuir a
pressão sobre as florestas naturais, face à crescente procura por
madeira, no combate à desflorestação. Segundo menciona, são ainda
fundamentais para garantir o restauro de áreas antes ocupadas por
florestas.
Nesta
sua recente mensagem, manteve o relato emocionante, as imagens
continuam deslumbrantes. Hoje, a mensagem não só entra em nossas
casas pela televisão, como é emitida por múltiplos instrumentos de
difusão de sons e imagens.
Mas,
não será dúbia a mensagem? Há que analisar o teor da mesma com
base no histórico recente, mesmo tendo presente a celebridade e a
credibilidade de que goza Sir David Attenborough..
De
acordo com a FAO, no último quarto de século, a área de florestas
no mundo, plantações incluídas, registou uma contracção de 129
milhões de hectares, aproximadamente a superfície da África do
Sul.
Entre
1990 e 2015, a maior perda de área florestal total foi registada na
região tropical da América do Sul e de África. A taxa de variação
registada foi negativa de 0,17% ao ano. No que respeita à taxa de
variação para as florestas naturais, registada no mesmo período,
está foi negativa de 0,24% ao ano. Já no que respeita às
plantações lenhosas a taxa de variação foi positiva de 1,84% ao
ano. Em área, a perda anual de florestas naturais foi de 6,5 milhões
de hectares ao ano. Apesar do aumento anual de 3,3 milhões de
hectares de plantações lenhosas, a pressão sobre as florestas
naturais persistiu elevada.
Recentes
anúncios sobre o aumento da exploração na região amazónica
corroboram uma persistente pressão sobre as florestas naturais. Não
raras vezes, a pressão sobre estas florestas decorre do interesse na
instalação de plantações lenhosas. Há que ter em conta, por
exemplo, a diminuição da área da Mata Atlàntica e o aumento da
área de plantações de eucalipto para celulose e papel em vários
Estados do Brasil.
A
anunciada intenção da União Europeia em aumentar a taxa de
utilização da biomassa florestal primária para a produção de
energia eléctrica não augura diminuição da pressão sobre as
florestais naturais e semi-naturais em países terceiros,
designadamente nos Estados Unidos, no Canadá, na Rússia e no
Brasil. Mesmo no espaço da União, tem-se registado um aumento dessa
pressão, como registado na Polónia ou em Itália, incluindo em
áreas da Rede Natura 2000.
Face
à actual confusão (propositada?) de conceitos, a que se estará a
referir Attenborough quanto a “farm trees”. Sera à plantações
de exóticas ou a reflorestação, por plantação, de espécies
autóctones? Estará a referir-se a “plantations for people” da
WWF? Seja lá o que isso representa.
Sem
uma alteração dos padrões de consumo, as plantações lenhosas
serão incapazes de assegurar uma diminuição da pressão pela
procura de madeira em florestas naturais. Antes pelo contrário,
podem aumentar essa pressão. As plantações lenhosas estão
associadas à produção de madeira para trituração, para a
produção de bens de ciclo de vida curto, como as pellets
energéticas ou o papel. Nas florestas naturais e semi-naturais, a
procura incide sobretudo por madeira para serração, associada a
bens de ciclo longo, como a madeira para construção e para
mobiliário.
Para
uma diminuição efectiva da pressão sobre as florestas naturais e
semi-naturais, as plantações lenhosas terão de ser associadas à
utilização preferencial da madeira em regime de cascata, com
utilização prioritária para a produção de bens de ciclo longo de
sequestro de carbono, reutilizados depois os resíduos de madeira da
indústria transformadora na produção de bens de ciclo curto.
Curiosamente, Portugal tem-se especializado cada vez mais na produção
de madeira para trituração, em detrimento da cortiça e da madeira
para serração.
Sem
adequar os padrões do consumo de madeira à necessidade de preservar
as florestas naturais, a mensagem de David Attenborough não passa,
infelizmente, de mera falácia.
No
caso português, como noutras regiões do mundo, as plantações
lenhosas de espécies exóticas estão ainda associadas a enormes
risco de depreciação do território rural e delapidação dos
recursos naturais endógenos, seja pela perda de biodiversidade e
pela maior facilidade na proliferação de pragas e doenças e
propagação dos incêndios rurais.
Foto de Olinda Gama (Revista O Instalador)
Paulo
Pimenta de Castro
Engenheiro
silvicultor
Presidente
da Direcção da Acréscimo – Associação de Promoção ao
Investimento Florestal
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