domingo, 12 de janeiro de 2020

A verdadeira face do My Planet by Navigator


O grupo The Navigator Company criou recentemente uma campanha de bons momentos de vivencia na e com a natureza. Deu-lhe a designação My Planet e o hashtag #myplanet associado. O que nos oferece hoje a Navigator?

A área de plantações de que se abastece a Navigator e outro grupo de celulose atinge cerca de 9% do território continental de Portugal. É a maior área relativa mundial de plantações de eucalipto. Uma área de plantações com uma produtividade media anual miserável, esmagadoramente sujeita a uma gestão de elevadíssimo risco. Ou seja, encontra-se sob abandono. Se em determinadas áreas se registam produtividades acima dos 20 metros cúbicos por hectare e ano, a média nacional não atinge os 6 metros cúbicos. Na esmagadora maioria da área destas plantações as taxas internas de rentabilidade (TIR) dos investimentos são negativas, para o seu ciclo global (36 a 48 anos, com posterior replantação ao reconversão).

Grande parte da área de plantações de eucalipto em Portugal está sujeita a contratos leoninos de arrendamento com as celuloses, onde as rotações finais acabam abandonadas, a aguardar o resgate pelos contribuintes. Resgate este já em curso. Têm sido anunciados múltiplos apoios financeiros públicos à replantação ou à reconversão de eucaliptal. Afinal, o rendimento que dizem que tal investimento gera não abrange o ciclo todo, fica-se por metade? Metade, mas não para todos!

A distribuição da riqueza ao longo da fileira das plantações de eucalipto assenta em mercados a funcionar em concorrência imperfeita, dominados por um duopólio industrial. As despesas de gestão dos eucaliptais sofrem acréscimo anual, o preço da rolaria de eucalipto a porta da fábrica, há décadas, está longe de acompanhar tal acréscimo. As governações reconhecem o problema, mas são omissas em acção. Pelo contrário, têm sido generosas na atribuição de benefícios fiscais. Muito generosas!

As plantações de eucalipto em Portugal atingem 28% da área florestal nacional, área onde a perda de biodiversidade é evidenciada em vários estudos científicos. Área sujeita a um crescente risco de propagação de grandes incêndios, para além de evidenciar uma exponencial proliferação de pragas e de doenças.

A expansão da área de eucaliptal em Portugal está associada às portas giratórias existentes entre médios e altos cargos das celuloses e o exercício de funções dirigentes na Administração e nos Governos. Desta forma se explicam os atropelos aos princípios e objectivos inscritos na Lei de Bases da Política Florestal, aprovada por unanimidade no Parlamento em 1996. Tivessem tais princípios e objectivos sido seguidos e dificilmente o país teria vivenciado as más experiências de 2016, 2017 e 2018, entre outras e as que se perspectivam. O eucalipto é, sem sombra de dúvidas, espécie invasora pós-incêndio. Esta sua capacidade associada ao abandono da gestão do território não augura boas novas para o futuro da conservação da natureza ou para a segurança das populações.

Mas, o grau de irresponsabilidade das celuloses não se fica pelo território português. O grupo The Navigator Company tem sido visado em estudos internacionais realizados em Moçambique, onde são evidenciados vários atropelos sobre as populações.

A campanha criada pela Navigator apresenta-nos bons momentos vivência na natureza, mas a sua real face no terreno é contrária a essa vivência. Há aqui um paradoxo.

Decididamente, o meu planeta não e My Planet. O grupo empresarial Navigator, persiste num rumo de irresponsabilidade ambiental e social em Portugal e em Moçambique. Esta sua campanha #myplanet não passa de uma ordinária acção de greenwashing.

Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro silvicultor
Presidente da Direcção da ACRÈSCIMO – Associação de Promoção ao Investimento Florestal