terça-feira, 8 de dezembro de 2015

As dúvidas sobre a gestão florestal

Como técnico florestal não as deveria ter. Mas tenho! Na verdade, não são sobre o conceito, mas são sim sobre a leitura que as várias partes interessadas fazem do mesmo.

Vamos ao conceito e à sua evolução histórica. Em 1958, o conceito foi definido como a aplicação de métodos comerciais/empresariais e de princípios técnicos silvícolas na administração de uma propriedade florestal. Com a Conferência do Rio’92, o conceito evoluiu, respeitando à administração das florestas para a obtenção de benefícios económicos e sociais, respeitando os mecanismos de sustentabilidade dos ecossistemas. Assim, às componentes comercial e técnica associaram-se outras duas, uma social e uma ambiental.


Como parecem ler o conceito os técnicos florestais? Na sua maioria, talvez por defeito de formação, aparentam vê-lo somente do lado da componente técnica, ultimamente da ambiental. Em geral, aplicam o conceito pela metade. Quanto da atual situação de declínio da floresta resulta desta falha grave? Sem uma componente financeira e outra sociológica, a derrota nas suas intervenções prosseguirá. Mesmo na apologia da gestão sustentável, como é possível dissociar melhoria da produtividade e conservação da biodiversidade do rendimento e das pessoas que as sustentem? Só por milagre! Mais ainda num país quase exclusivamente de floresta privada.

Como é lido pelos atuais industriais que se abastecem de bens obtidos nas florestas? Em geral, sobretudo nos grupos empresariais, lêem o conceito pelo lado do que lhes possa proporcionar oferta de maior qualidade a custo protegido pelas governações. Uma leitura em modo egoísta. Responsabilidade empresarial? Só nos famigerados “relatórios de sustentabilidade”. O conceito e a sua certificação só lhes dão jeito para atingir mercados mais rentáveis para os seus produtos. Já pagar para que o mesmo seja sustentado e sustentável, só em modo de exigência à produção e, de algumas décadas a esta parte, aos contribuintes. Da gestão florestal querem distância, estão cada vez mais distantes das florestas, da área de risco da satisfação dos seus interesses financeiros. Afinal, têm sempre as importações como salvaguarda e meio de controlo de preços à oferta, ao que parece, por denúncias vindas a público, mesmo as ilegais.

Como o lêem os dirigentes das organizações de produtores florestais? A avaliar pela evolução do rendimento empresarial líquido na silvicultura, não sei bem! Lêem-no?

Como o vêem os governantes? Não sendo especialistas e tendo sido mal assessorados, têm aparentado vê-lo da forma que lhes dá mais jeito. E o “jeito” tem vindo cada vez mais do lado industrial.

Portugal é hoje o único país do continente europeu em manifesta desflorestação, com protecionismo governamental à indústria, em incontido êxodo rural e com o principal exportador de bens de base florestal sob suspeita de praticas imorais num dos principais mercados internacionais. Será isto resultado de um percurso brilhante? Afinal, quanto valem as exportações do setor florestal, que os discursos gostam tanto de enunciar como apelo ao orgulho nacional?

Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro Silvicultor


1 comentário:

  1. Quem manda nesta grandes empresas não percebe nada de floresta, só vê números a curto prazo e não percebe que a longo prazo está a condenar a empresa ao declínio, por falta de competitividade, por falta de matéria prima de qualidade. Prefere pagar mais para importar madeira do que pagar em Portugal um preço decente que faça valer a pena olhar para a floresta com outros olhos

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