É recente o aval da Comissão
Europeia para o apoio estatal à Navigator, no montante de 12 milhões de euros,
destinado ao complexo industrial em Cacia, Aveiro. Já em 2018, o Estado
concedeu um crédito fiscal em sede de IRC à Navigator, envolvendo o aumento de
capacidade industrial na unidade fabril da Figueira da Foz. Anualmente, as
celuloses auferem milhões de euros do Estado sob a forma de benefícios fiscais.
Não é difícil encontrar as celuloses nas posições cimeiras em montante de
benefício constante das listagens anuais da Autoridade Tributária e Aduaneira,
logo a seguir a empresas do sector energético. Este último onde as celuloses
têm assumido crescente destaque. Pela queima de árvores também produzem
electricidade.
No que respeita aos apoios ao
abastecimento em madeira de eucalipto, o actual governo, em 2017, aprovou uma
ajuda pública de 18 milhões de euros destinada a acções de replantação com
eucalipto (sinal de que a “rentabilidade” da cultura está envolta em falácias).
Foi ainda este governo que, na aprovação dos Planos Regionais de Ordenamento do
Território, possibilita a expansão da cultura por too o país, incluindo no
mítico e degradado Parque Nacional da Peneda Gerês. No histórico do actual
governo fica ainda o maior “licenciamento” da expansão da área de eucalipto, desde
Outubro de 2013.
Há dias, o governo anunciou
ter disponíveis 3,7 milhões de euros, através do Fundo Ambiental, para apoiar
acções de arranque de eucalipto. O apoio do Fundo Ambiental, estabelecido no Aviso
n.º 13655/2019, de 2 de Setembro, emitido pelo Ministério do Ambiente e
Transição Energética, tem no descritivo a remuneração dos serviços dos
ecossistemas em espaços rurais. Até aqui estamos de acordo. É urgente complementar
a equação do rendimento em espaços rurais com a remuneração á prestação dos
vários serviços que a sociedade usufrui a partir de tais espaços. Entre estes
estão a preservação dos solos, da biodiversidade, da quantidade e qualidade da
água, da paisagem, do turismo.
Mas, será que esta remuneração dos
serviços dos ecossistemas, que inicia com o arranque de eucaliptos, envolve a
redução da área desta espécie no território português? Não necessariamente!
Depende. Na base da medida pode estar um apoio encapotado à transferência de
plantações desta espécie exótica entre diferentes regiões do território
nacional, envolvendo inclusive o apoio à permuta entre áreas sob gestão das
celuloses. Esta permuta está prevista na Lei n.º 77/2017, de 17 de Agosto,
concretamente no seu Artigo 3.º-B. Os encargos associados a este arranque têm
valores mínimos de 500 euros por hectare, avançados pelo Ministério da
Agricultura, para áreas com declive inferior a 5% e uma densidade até 800 cepos
por hectare.
Estudos indicam um crescente
condicionamento ambiental à cultura do eucalipto a sul e um subsequente aumento
da pressão a norte. Na base estão as alterações climáticas. Se esta
transferência tiver o suporte do Orçamento tanto melhor, não ficam
comprometidas parte da distribuição de dividendos aos accionistas.
O apoio do Fundo Ambiental tem por
beneficiários entidades nas quais as celuloses, através das unidades sob sua
gestão existentes nas áreas geográficas abrangidas por tais entidades, se podem
constituir com sócias ou associadas, consoante tais entidades estejam
constituídas nos termos do Código das Sociedades Comerciais, do Código Civil ou
do Código Cooperativo. Podem assim auferir facilmente do generoso apoio
estatal.
As áreas a que se destina o apoio, a
Paisagem Protegida da Serra do Açor e o Parque Natural do Tejo Internacional,
envolvem os concelhos de Arganil, Castelo Branco, Idanha-a-Nova e Vila Velha do
Ródão. Nestes concelhos, só a Navigator tem sob gestão mais de 16 mil hectares
(mais de uma cidade e meia de Lisboa).
Em si, o apoio público a um resgate
do território para eliminação da epidemia de eucaliptal, sob gestão de
abandono, era expectável e é urgente. No entanto, não é aceitável que esse
apoio envolva áreas próprias ou sob gestão das celuloses. Será um prémio à má
conduta, à irresponsabilidade empresarial, social e ambiental. Percebe-se,
contudo, o apoio às famílias que por estas foram arrastadas no pressuposto de
falaciosas rentabilidades, muitas vezes através de contratos leoninos. Vê-se
que essa “rentabilidade” carece do suporte do Orçamento de Estado. Quanto mais
não seja, para o resgate ao território, associado à urgente redução do risco,
no combate ao despovoamento e na luta contra o avanço da desertificação e às
alterações climáticas.
Em conclusão, urge que o governo
esclareça que no âmbito deste apoio do Fundo Ambiental não estão envolvidos os
“projectos de compensação”, previsto no “alçapão” criado pelo disposto no Art-º
3-º-B da Lei n.º 77/2017, que possibilita a transferência de plantações de
eucalipto entre regiões do país. Tais permutas devem ser asseguradas pelas
próprias celuloses, desonerando o investimento público pelos erros privados que
cometeram.
Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro Silvicultor
Presidente da Direcção
da Acréscimo, Associação de Promoção ao Investimento Florestal
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