A estratégia empresarial da indústria papeleira
nacional, nos anos mais recentes, não aparente ser mais do que uma estratégia
de “porta da fábrica para dentro”, o que na prática pode ser definido como
estratégia do, ou pelo, filet mignon, de riscos oportunisticamente controlados,
em sistema quanto mais fechado possível. A estratégia assenta na desresponsabilização
pela forma como é obtida a matéria-prima que sustenta o negócio da pasta
celulósica e do papel, com quebra de compromisso com a produção florestal e com
o subsetor da exploração florestal e comércio de madeiras, situação ímpar ao
constado noutros produtores de pasta celulósica e papel em países desenvolvidos
ou emergentes. A evolução dos preços, do rendimento empresarial líquido na
silvicultura (ou seja, o setor antes da porta da fábrica) e do peso do Valor
Acrescentado Bruto (VAB) deste setor primário no VAB nacional, traduzidos nas
Contas Económicas da Silvicultura, publicados anualmente pelo Instituto
Nacional de Estatística, são elucidativos.
O papel do Poder Executivo, traduzido
na prática seguida pelos vários Governos, de acordo com as estratégias levadas
a cabo pelas diferentes equipas ministeriais com a tutela da Silvicultura (o
atual MAMAOT mais do que incluído) e da Economia, tem sido o de aparente subjugação
a esta estratégia empresarial, designadamente no que respeita à produção
legislativa, onde se enquadra a proposta de alteração legislativa às ações de
arborização e rearborização tornada pública em maio de 2012. Esta prática
governativa tem sido justificada fundamentalmente com o peso do setor papeleiro
no Produto Interno Bruto (PIB) e nas exportações.
Se por um lado o peso do setor
florestal no PIB tem decrescido acentuadamente nos últimos anos (o próprio PIB
tem decrescido), com maior destaque na indústria florestal do que na
silvicultura, o facto é que, no que respeita às exportações não está
quantificado o seu valor líquido. Ou seja, ao valor bruto das exportações não
estão deduzidos os encargos com a depreciação dos recursos naturais, nem do Território,
nem os custos associados aos incêndios florestais, resultantes da gestão
deficiente dos eucaliptais, inerente à quebra de rentabilidade do negócio da
produção de rolaria para trituração, sobretudo em regiões onde predomina o minifúndio
(regiões Centro, Norte e Algarve).
O atual Ministério com o pelouro das
florestas, face aos evidentes indícios de concorrência imperfeita neste setor,
dos riscos económicos, mas sobretudo sociais e ambientais decorrentes, insiste
em não acompanhar a evolução dos mercados, muito menos em desenvolver os
instrumentos inerentes à efetiva regulação dos mesmos.
Pior, permite que se mantenha a exclusividade
na utilização do eucalipto pela indústria papeleira, não desenvolvendo os
mecanismos de fomento a outras utilizações desta madeira, designadamente as que
se possam consubstanciar na redução das importações de carvão mineral pelas
centras termoelétricas nacionais (Abrantes e Sines), ou na redução das
importações de madeira para a indústria de serração, designadamente pelo
desenvolvimento de metodologias de utilização da madeira de eucalipto na
construção civil ou mesmo para a produção de mobiliário, certamente com maior
valor acrescentado do que a produção de rolaria para trituração. Não que estas
outras oportunidades fossem substitutas da indústria de pasta celulósica e
papel, mas que lhe fossem complementares, com mais valias para o País.
Mas, será este caso da indústria papeleira
único? Infelizmente não, o setor florestal em Portugal tem servido de base ao
desenvolvimento de outros negócios industriais de estratégia do filet mignon.
Por exemplo, na produção de energia através da biomassa florestal, seja na
energia elétrica, com as famosas centrais termoelétricas a biomassa, seja na
produção de pellets energéticas, estas últimas com crescente pelo bruto
nas exportações, muito embora assente na prática num negócio de “erradicação” oportunista
do nemátodo da madeira de pinheiro bravo.
E o osso?
Bom, esse é suportado pela Sociedade,
por um lado com os benefícios fiscais que são atribuídas pelos Governos às
empresas papeleiras (cerca de 50 milhões de euros só em 2010 e 2011), por outro
pela depreciação dos recursos naturais, do Território, com efeito, entre
outros, no êxodo rural, e nos incêndios florestais, este últimos com encargos anuais
superiores a 1.000 milhões de euros, e que na última década se estima terem
sido responsáveis pela emissão para a atmosfera de mais de 2,4 milhões de
toneladas de dióxido de carbono (CO2 eq.), desperdiçando-se mais do
que o equivalente a 5,7 milhões de barris de petróleo.
Paulo Pimenta de Castro, Eng. Florestal
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