Há um
conjunto de dogmas que parecem ter sido postos em causa por um vírus,
designadamente aqueles que estão relacionados com o papel do Estado. Parecem! Obviamente,
merece destaque o Serviço Nacional de Saúde, mas há outros domínios que devem
merecer reflexão. Até pelos efeitos que produzem sobre a segurança e saúde das
populações, directamente nas rurais, subsequentemente nas urbanas.
Infelizmente,
no que respeita à política florestal, os incêndios catastróficos têm sido
insuficientes para a alteração da doutrina que tem feito o histórico dos
últimos trinta anos. Mas, não são só os incêndios. Pragas e doenças proliferam
pelo território. Más práticas colocam em causa solos, recursos hídricos e a
biodiversidade. Um histórico de delapidação dos recursos naturais, de
desvalorização dos territórios, de acréscimo de insegurança para as populações.
Um histórico de esvaziamento dos instrumentos públicos de política florestal,
seja ao nível da autoridade florestal nacional, na investigação florestal, bem
como na transmissão do conhecimento e na regulação dos mercados. Estes últimos,
claramente a operar em concorrência imperfeita, ou seja, dominados pelos interesses
de sectores industriais, mais preocupados com a distribuição de dividendos, do
que em estabelecer relações de equilíbrio com quem, no terreno, produz os bens que
os espaços florestais e agroflorestais proporcionam.
Dos
instrumentos privados de política florestal, apesar do crescimento registado
nas três últimas décadas, designadamente em associações de produtores,
constata-se uma recorrente dependência de fundos públicos. Globalmente, têm-se
mostrado incapazes de substituir as perdas associadas ao esvaziamento das entidades
públicas. Concretamente, no que respeita à transmissão do conhecimento e na
melhoria do rendimento dos seus representados. Estes, são domínios fundamentais
para assegurar a sustentabilidade dos recursos naturais, a valorização dos
territórios e a segurança e saúde das populações, rurais e urbanas.
Tendo
presente o histórico e a doutrina que o forjou, há que aproveitar o presente
momento para reflectir sobre que futuro queremos para o território e para os
seus espaços florestais e agroflorestais, bem como, quais os instrumentos
essenciais para levar a cabo as medidas de política que sirvam à concretização
das escolhas efectuadas.
Se as
escolhas para o futuro assentarem na prossecução dos princípios e objectivos
estabelecidos na Lei de Bases da Política Florestal, aprovados em 1996 e
engavetados logo de seguida, parece-nos fundamental a aposta em quatro pilares:
- O reforço de meios técnicos e materiais da autoridade florestal nacional, designadamente ao nível da fiscalização, re-equacionando a recuperação do Corpo Nacional da Guarda Florestal;
- O rejuvenescimento dos quadros da investigação florestal pública, descentralizando a sua intervenção e privilegiando acções que reforcem a capacidade de intervenção sustentada e sustentável do sector florestal;
- A recuperação de um instrumento de transmissão do conhecimento gerado, um serviço de extensão de cariz público, ou público-provado, a operar em conjunto com organizações associativas da produção florestal; e,
- A reconstrução de um instrumento de regulação dos mercados, por forma a garantir um equilíbrio mínimo que assegure segurança para o território e para as populações.
O aumento
da área florestal na posse do Estado, como previsto na Lei de Bases, é
fundamental. Não apenas para preservar e conservar espécies e habitats, mas
também para assegurar produções de maior retorno no investimento, ou sistemas
de produção mais próximos da natureza. É igualmente fundamental para a criação
de centros de ensaio e demonstração, em apoio à gestão privada
Na gestão
privada, há que reformular a equação do rendimento silvícola e
agro-silvo-pastoril, incorporando nesta a remuneração dos serviços dos
ecossistemas. Remuneração essa estabelecida em regime de prestação de serviços
à sociedade, devidamente assessorados e fiscalizados por adequados instrumentos
de política florestal. Seja por um serviço de extensão, seja pela autoridade
florestal nacional.
Para quem
critica o mais Estado, sim temos de recuperar o esvaziamento interessado a que
foi submetido. Todavia, o que aqui se defende é, sobretudo, melhor Estado. Seja
ao nível da Administração, seja numa intervenção mais responsável por parte dos
agentes privados.
Paulo Pimenta de Castro
Engenheiro silvicultor
Presidente da Direção da Acréscimo – Associação
de Promoção ao Investimento Florestal
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