- Depois do notabilíssimo trabalho dos Serviços Florestais de fixação das dunas e da correcção torrencial (efectuado no início do séc. XX) o Estado Novo decidiu nos seus Planos de Fomento, fazer de Portugal um “país florestal”.
- Em solos paupérrimos e esqueléticos apostou-se em força no Pinheiro Bravo, como espécie rústica e “pioneira”, capaz de proporcionar a recuperação das séries florísticas e dos solos e de produzir matéria prima lenhosa para a indústria de serração e… para a indústria de pasta celulósica.
- A “descoberta” portuguesa (posterior) do eucalipto globulus para fazer, pela primeira vez no Mundo (!), pasta Kraft branqueada e, depois, papel de altíssima qualidade, “empurrou” a indústria nacional de pasta celulósica para o eucalipto em detrimento do pinheiro, com vista a tirar partido das vantagens competitivas que o eucalipto globulus proporcionava.
- A decisão política de instalar a Celangol em Portugal, após a Revolução de 1974, com o nome de Soporcel, desencadeou uma corrida “natural” às terras para plantar eucalipto, com o objectivo de satisfazer as necessidades da indústria nacional.
- Vivia-se, à época, num quadro de total “desregulação” em matéria de florestações e de erros técnicos e de sobressaltos sociais que ocorreram nesse período de “eucaliptização” – alimentada por uma política de fomento da espécie alicerçado no preço – nasceu a legislação de 1988 (DL 175/88) baseada no “princípio da precaução” e com medidas técnica e socialmente pioneiras (obrigatoriedade de projecto silvícola prévio, envolvimento social das CM’s, introdução de AIA e EIA, etc.).
- A luta de competências no interior da Administração Pública e a ignorância da realidade florestal geraram porém (em anos sucessivos e sem cessar) uma “montanha” de peças legislativas descoordenadas, caóticas e técnica (e ambientalmente) inúteis, torcendo a legislação de 1988 (que agora se viu elogiada pela Quercus e pela LPN…).
- Recorde-se aqui que a cultura do eucalipto nunca esteve interdita (ou sequer condicionada), de per si, antes se destinando todo o processo de licenciamento à prestação da garantia do uso das melhores práticas silvícolas, da salvaguarda de recursos naturais importantes e do cumprimento de legislação anexa mas autónoma.
- A partir dos ditos anos de 80 a indústria passou, por razões óbvias, a prestar especial atenção (e apoio técnico e financeiro) aos IFN, de forma a planear o seu futuro.
- Neste ambiente disfuncional, o Estado nunca se absteve – antes pelo contrário – de estimular a indústria (não a floresta) para crescer e exportar.
- O último exemplo foi o aumento de capacidade da CELBI (mais 300 mil ton. de pasta correspondentes a mais 1 milhão de metros cúbicos de eucalipto) em 2004/2005, quando após os fogos de 2003 e 2005, já todos sabiam que o eucaliptal português não seria capaz de alimentar a capacidade industrial já antes instalada em Portugal.
- O sector em geral e a Portucel em particular, em Dezembro de 2005 (aquando do grande investimento industrial que protagonizou) apresentou ao Governo dossiers documentados que provavam a necessidade (e compatibilidade ambiental) de florestar (e reflorestar) com urgência mais e melhores eucaliptais.
- O Código Florestal (aprovado no final do primeiro governo do Eng. Sócrates, sendo Secretário de Estado o Dr. Ascenço Simões) já incluía nas suas medidas, a solução de parte dos problemas burocráticos associados ao licenciamento de florestações e reflorestações (com eucalipto e não só): Revogação de “ganga” legislativa, prazos rígidos para aprovação de projectos (excepto para o abate de sobreiros), limitação do valor das taxas, diminuição drástica da intervenção das Autarquias, etc. já aí constavam, sem que se tenha registado contestação pública ou política...!
- Em 2007 o ISA publicou (ISA Press) o “estado da arte” da investigação sobre os impactes ambientais do eucalipto – com um notável Prólogo do Prof. Oliveira Baptista - e os Serviços Florestais foram entretanto acumulando saber e conhecimento dos impactes associados ao acto de florestar e reflorestar.
- Foi ficando óbvio para todos que o que importava/importa acautelar era/é a preservação do solo, da água e da biodiversidade e isso não é específico do eucalipto nem pesa da mesma maneira nas florestações e nas reflorestações.
- O actual projecto de diploma – pesem embora as suas limitações – é um passo positivo na resolução do problema burocrático e na adopção / incorporação do conhecimento científico relativo às arborizações e rearborizações (dispensando estas últimas de uma série de procedimentos tecnicamente inúteis).
- A proposta legislativa em causa não resolve – nem é a peça legislativa para o fazer - a questão da (necessária) diminuição do risco associado à implantação de novos espaços florestais, não acautela os problemas eventualmente associados à excessiva extensão de massas florestais excessivamente contínuas mal geridas e não melhora, por si só, a sustentabilidade da floresta portuguesa.
- O documento – que não deixa por isso de ser positivo - não dispensa a tomada de medidas urgentes para uma gestão profissional e activa dos espaços florestais, com vista ao fomento da diversidade necessária das espécies em presença e da diminuição do risco associado ao investimento florestal em Portugal (só possível com escala adequada das unidades de gestão florestal).
- Sabendo-se hoje que o eucalipto é a única espécie que paga as operações culturais e as medidas ambientais indispensáveis numa silvicultura moderna, sã e de baixo risco, importa que o Governo (ou Governos) adoptem medidas que estimulem e viabilizem economicamente alternativas (complementares) de espécies ambientalmente (e industrialmente) interessantes que hoje não são economicamente viáveis.
- Ora se isso hoje não está a ser conseguido tal não se fica, obviamente, a dever aos proprietários florestais privados nem, muito menos, ao eucalipto enquanto espécie florestal.
- A prova do que fica dito é que o acréscimo (sensível) de área de eucalipto nos últimos 30 anos, quase integralmente conseguido com investimentos privados (com a excepção pontual do Projecto do Banco Mundial, antes da adesão à CEE) ao passo que o pinho, inequivoca e deliberadamente apoiado pelos dinheiros ditos “públicos” (700 milhões de euros após a adesão, só para áreas novas) não só não gerou um acréscimos da área (generosamente) subsidiada pelos dinheiros disponibilizados a fundo perdido (350 mil hectares) como ainda recuou 400 mil hectares no mesmo período. Ou seja, uma espécie cresceu com o investimento privado e gerou riqueza para o país e a outra recuou e delapidou, sem glória nem proveito para o país, o dinheiro dos contribuintes nacionais e comunitários.
- Obviamente que tal não se fica a dever à espécie em si mas ao facto de a primeira gerar meios financeiros para ser bem (ou medianamente) gerida e protegida, enquanto a outra continua economica e estruturalmente inviável.
- É pois claro o papel do Estado e da Sociedade: Criar condições para que o dinheiro público investido – e bem – nas espécies economicamente menos rendáveis seja aplicado em condições de risco e sucesso aceitáveis.
- (Tal não quer dizer que não se deva ajudar igualmente a melhoria da gestão dos pequenos povoamentos de eucalipto que, ainda hoje, constituem uma parte significativa da “floresta social” que predomina em Portugal...).
- E todos sabemos donde vem o risco e o inerente insucesso... não é, seguramente, do sucesso do eucalipto!
João M. A. Soares
Engenheiro Agrónomo
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